Ensaio Sobre a Cegueira. Sua visão do mundo nunca mais será a mesma

O ser humano é ruim por natureza.

Se você teve aulas de Sociologia ou Filosofia no Ensino Médio, provavelmente ouviu falar de Thomas Hobbes, certo? Ele foi um importante matemático e cientista político. Além de um importante filósofo, que escreveu o livro que hoje, é considerado uma das grandes obras da Sociologia, O Leviatã (1651), onde ele escreve sobre o estado de natureza do homem e discorre sobre os motivos pelos quais as leis devem ser aplicadas na sociedade como um todo. Admitindo que o homem seja ruim por natureza, que só se impõe sobre outro homem por meio da força e posteriormente à violência.

 

E isso nunca havia feito total sentido pra mim. Sempre fiquei pensando: “Como um homem pode ser mal por natureza? Sou vegetariano, ajudo o Greenpeace, tenho animais de estimação e não jogo lixo na rua. Ainda assim, como poderia eu ser um homem mau?”



 

Então eu assisti “Ensaio sobre a Cegueira”, em inglês “Blindness”. Um filme de 2008, dirigido por Fernando Meirelles, um brilhante diretor, brasileiro, que dirigiu filmes como “Tropicália”, “360”, “Nemesis” e “A Busca”.

 

O filme, baseado no livro de mesmo título, do escritor português José Saramago, lançado em 1995, que conta um relato impressionante sobre uma epidemia de cegueira que atinge uma cidade. Essa epidemia passa a ser chamada de Cegueira Branca, devido ao fato de que as pessoas atingidas passam a enxergar uma superfície branca, sem alterações de padrão, que surge inicialmente em um homem no trânsito e, pouco a pouco, a doença se espalha por todo o país, e os afetados pela cegueira são colocados em um complexo totalmente fechado, sobre quarentena, sendo vigiados pelo exército 24 horas por dia. Porém conforme o tempo passa, o Estado deixa de suprir as necessidades dos afetados, devido ao crescimento exacerbado da doença. Logo, as pessoas passam a lutar por suas necessidades básicas, como comida, água e até mesmo espaço, expondo-se aos seus instintos primários. Nesta situação a única esperança que lhes resta é a mulher de um dos afetados, que ainda consegue enxergar. E vai até seu limite mental e físico para encontrar, junto a todos os afetados do complexo, uma saída viável, em uma aventura para encontrar o resto de humanidade que resta nas pessoas.

 

Quando perguntado a José Saramago, autor do livro, sobre quais as reações ele esperava de seus leitores, disse: “Este é um livro francamente terrível com o qual eu quero que o leitor sofra tanto como eu sofri ao escrevê-lo. Nele se descreve uma longa tortura. É um livro brutal e violento e é simultaneamente uma das experiências mais dolorosas da minha vida. São 300 páginas de constante aflição. Através da escrita, tentei dizer que não somos bons e que é preciso que tenhamos coragem para reconhecer isso.”.

 

E o filme não decepcionou. Um retrato fiel do livro, que mostra com muitos argumentos que o ser humano não é bom. E que não há ordem enquanto há plena liberdade. E que é um passo importante reconhecer que você, por natureza não é bom.

 

A fotografia do filme é linda. Muito bem selecionada, dando a nítida impressão de aflição e tristeza durante todo o filme. A baixa saturação e a elevação dos tons verdes e azuis realçam essa sensação de aperto e dificuldade.

 

O filme não possui trilha sonora, exceto por algumas músicas eruditas de fundo. Isso, claro para deixar o filme ainda mais expressivo, os diálogos são simples, porém densos, e o visual é impressionante.

 

O Elenco foi muito bem selecionado, Julianne Moore, Mark Ruffalo, Alice Braga e Danny Glover fizeram atuações incríveis. Da cena mais feliz possível, até a de maior dificuldade. Todos representaram seus papeis com a real determinação e sensibilidade que esse filme necessitou.

 

Algumas partes do filme foram rodadas em São Paulo, algumas em Osasco, uma cidade próxima da minha casa. Tudo isso para honrar o único pedido de José Saramago, quando perguntado o que gostaria de ver no filme, disse que apenas não queria que o local onde a história se passasse fosse reconhecível. Justamente, creio eu, para passar a sensação de que a maldade é endêmica e é parte de todos, do mais pobre ao mais rico.

 

Por fim, um filme que vale muito a pena ser assistido, e se sobrar tempo, melhor ainda ler o livro, que me fez repensar como as minhas atitudes dependem de uma série de fatores para que sejam aceitas e que sejam éticas. E que vai fazer você perceber que o Estado trabalha muito bem, quanto à determinação da ordem na sociedade. Com certeza, você vai perceber que o motivo de toda a desorganização social no mundo é culpa do homem, e que os problemas ambientais são culpa do homem, não de um exclusivo, mas de todos, que naturalmente tornar-se-ão violentos e intolerantes quando os recursos naturais estiverem acabando, quando Petróleo não existir mais, quando água for um bem cada vez mais difícil de encontrar. Então veremos o real estado de natureza do homem. Porque é como disse Thomas Hobbes: “O Homem, é o Lobo do Homem”, e parece que isso não tardará a acontecer.